Notícia 31/01/2023

Com o apoio da PCDaS, disponibilização de dados e análises sobre mortalidade e morbidade das mães brasileiras são alvo de pesquisa

Com algoritmo preditivo e painel online de dados sobre a mortalidade materna, projeto explora recursos de várias bases de dados

  • Nelson Niero Neto

Ao longo de 2021 e 2022, um projeto que se debruçou sobre a mortalidade materna e a morbidade materna grave no Brasil contou com o apoio da equipe e da infraestrutura da Plataforma de Ciência de Dados aplicada à Saúde (PCDaS) para desenvolver seus trabalhos.

Intitulado “Vigilância da mortalidade materna e da morbidade materna grave” (VMMM), o projeto teve como motivação propor análises e possíveis melhorias em relação à vigilância, identificação e disponibilização destes casos no Brasil. A coordenação foi de Rosa Maria Soares Madeira Domingues, epidemiologista do Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI/Fiocruz) e docente da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca (ENSP/Fiocruz).

Após esforços iniciais de verificação e validação de dados e informações, o projeto está finalizando um algoritmo preditivo e desenvolvendo um painel online de informações — este, um esforço conjunto com outro projeto apoiado pela PCDaS, o Observatório Obstétrico Brasileiro (OOBr). Com indicadores provenientes de sistemas de informação disponíveis no Brasil, o painel poderá ser usado amplamente, inclusive por gestores públicos, para a vigilância e controle da mortalidade materna em seus municípios, estados ou regiões.

 

Grand Challenges Explorations e os dados sobre mortalidade materna no Brasil

Tanto o VMMM quanto o OOBr integram a segunda chamada do Grand Challenges Explorations – Brasil: Ciência de Dados para melhorar a saúde materno-infantil, saúde da mulher e da criança no Brasil, aberta em 2020. A PCDaS ainda apoia outros cinco projetos vinculados à segunda chamada, totalizando sete parcerias desde 2021, além de também ter apoiado uma iniciativa da primeira chamada, aberta em 2018.

A chamada atual foi apoiada pela Fundação Bill & Melinda Gates; pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações; pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), e pelo Departamento de Ciência e Tecnologia da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde (Decit/SCTIE/MS).

No caso do VMMM, uma das motivações para o desenvolvimento do projeto foi a preocupação com a mortalidade materna, ou seja, a morte de uma mulher durante a gestação ou até 42 dias após o término da gravidez, a partir de uma causa relacionada ou agravada pela gestação.

“A mortalidade materna ainda é muito elevada no Brasil, mas, apesar disso, é um evento raro em termos numéricos”, explica a coordenadora Rosa Domingues. “Por isso, é algo difícil de se estudar, principalmente quando se trata de municípios pequenos e afastados de grandes centros”. 

Considerando isso, os pesquisadores envolvidos decidiram monitorar também a morbidade materna grave — quando a mulher não morre, mas tem complicações graves durante a gravidez, parto ou puerpério —, evento chamado também de near miss (quase morte).

 

Finalidade e tamanho do Sistema de Informação Hospitalar foram desafios enfrentados pelo projeto 

Como produtos do projeto, a equipe decidiu desenvolver um algoritmo preditivo e um painel online de informações. No caso do algoritmo, o objetivo do grupo era identificar casos de morbidade materna grave, usando informações do Sistema de Informação Hospitalar (SIH) e técnicas de machine learning

Para isso, porém, houve um grande trabalho preliminar. “Antes de desenvolver o algoritmo, nós precisávamos avaliar se a cobertura do SIH era boa”, explica Rosa. As particularidades deste sistema de informações geraram alguns desafios à análise.

“Além de ser um sistema enorme, o SIH não tem uma lógica voltada para a vigilância”, explica Rosa. “Ele é mais voltado para o pagamento de despesas hospitalares, como as internações”. A equipe também precisava investigar se a qualidade dos registros do sistema eram boas. No processo de validação, o grupo passou a entender algumas das regras do sistema e organizar classificações e métodos de trabalho. “Foi uma etapa mais teórica, na busca por um caminho de como íamos trabalhar”.

Os números e dados do sistema foram considerados consistentes pela equipe, que decidiu usá-lo. “Acredito que o SIH seja um grande recurso para a vigilância de óbito e morbidade materna no país”, diz Rosa, “e hoje isso não é aproveitado”. 

Mas tudo isso, lembra a pesquisadora, foi “o que precisamos fazer antes de poder fazer o que de fato queríamos”, ou seja, o algoritmo preditivo do óbito materno, previsto para ser finalizado no final deste ano, e o painel de informações.

 

Painel de Informações sobre saúde da mulher visa ajudar gestores públicos

O produto em parceria com Observatório Obstétrico Brasileiro (OOBr) apresentará informações a nível municipal de forma agregada. Para isso, a equipe elencou os determinantes — ou seja, quais condições tornam as mulheres de uma determinada região ou cidade mais vulneráveis — para o óbito materno. Entre eles, estão as condições sócio-econômicas, o planejamento reprodutivo, o acesso a exames pré-natais, as condições de atenção ao parto, entre outros. 

“Nós listamos uma série de indicadores que seriam interessantes para o painel, e procuramos nos sistemas de informação existentes se esses dados estavam disponíveis”, explica Rosa. Neste caso, a equipe foi além do SIH e também coletou dados de outros sistemas nacionais de informação, como o Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (SINASC) e o Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM), enriquecendo as fontes disponíveis. “Em seguida, calculamos isso para todos os municípios do Brasil no período de 2012 a 2020”.

Segundo a pesquisadora, o objetivo final é que um secretário de saúde de uma cidade pequena possa acessar o painel e ter, de imediato, todas as informações importantes relacionadas à saúde da mulher no seu município nos últimos 10 anos. Rosa ressalta que atualmente isto não é algo trivial, uma vez que é preciso que alguém na gestão municipal saiba navegar no sistema de informações do SUS para encontrar os dados, tabulá-los e finalmente fazer a análise propriamente dita.

Ao juntar forças para viabilizar o painel, as equipes do VMMM e do OOBr conseguiram otimizar processos e esforços, uma vez que os integrantes do OOBr também planejavam criar um painel de indicadores obstétricos. “Esse trabalho conjunto, que começou em julho, foi a grande novidade do VMMM em 2022”, diz Rosa, pois, além do desenvolvimento em grupo, a parceria possibilitou que o painel seja hospedado permanentemente no site do OOBr.

 

Capacitação e conjuntos de dados marcam apoio da PCDaS ao longo do projeto

Assim como os outros seis projetos da segunda chamada do Grand Challenges Explorations Brasil, o VMMM teve acesso aos conjuntos de dados organizados e disponibilizados pela PCDaS, contando com informações sobre natalidade, mortalidade e estrutura dos estabelecimentos de saúde no país, entre outros. Estes conjuntos são tratados pela equipe de engenharia da Plataforma com o processo de ETL (sigla em inglês para Extrair, Transformar e Carregar), o que dispensa etapas de trabalho para os pesquisadores, facilitando o fluxo da pesquisa.

“Também foi muito boa a estratégia de capacitação em R e Python oferecida pela PCDaS no primeiro ano do projeto”, lembra Rosa, “bem como o acesso aos cursos do DataCamp”.

“Sem o apoio da PCDaS, acredito que os projetos levariam cerca de um ano para chegar ao ponto de partida que tiveram conosco”, diz Rebecca Salles, cientista de dados da PCDaS responsável pela intermediação entre a Plataforma e os pesquisadores dos sete projetos da chamada. “Além do ETL e da infraestrutura, nós colaboramos tornando os dados acessíveis. É uma expertise que os pesquisadores não costumam ter”.

Jefferson da Costa Lima, coordenador técnico da PCDaS, também destaca a vantagem de começar um projeto de pesquisa já tendo acesso imediato aos dados necessários. “Considerando que um projeto tem uma duração pré-definida, isso faz com que o pesquisador não perca tempo organizando e buscando dados”, explica. “Assim, o trabalho fica muito mais simples. O pesquisador fica totalmente focado em sua análise. A capacitação para lidar com dados em saúde é muito complexa, e a PCDaS faz esta etapa para o pesquisador com rapidez e qualidade”.


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